Tornando-nos quem realmente somos.
A minha jornada ao entrar e sair do Amebairro e encontrar a luz que nos mostra as cores que nossas vidas realmente têm.
Por Levi Rangel
Para mim é um grande privilégio poder escrever um texto para este Substack, mesmo não sendo mais parte do coletivo Amebairro. O privilégio não está nos milhões de fãs que lerão estas palavras, mas na oportunidade de colaborar com um projeto tão especial que pessoas que estão entre as que mais amo no planeta estão começando.
Da mesma forma que meu querido amigo e alma gêmea Dhavi Aron comentou em seu precioso texto, em princípio não tinha muita certeza sobre o que escrever. Talvez fosse algo mais clássico, como uma análise de um filme, álbum ou animação. Mas a verdade é que não tenho assistido ou ouvido muitas coisas novas, e o que mais tenho escrito ultimamente são apenas orações ou estudos. Foi então que o próprio Dhavi me perguntou: “você faria um texto convidado no substack explicando sua trajetória no amebairro?” e a ideia clicou.
É possível que nem todos os leitores conheçam a história que há por trás do que chamamos de “Amebairro”, essa gente tão atraente com um nome tão criativo e diferenciado. Em essência, o grupo é a junção de dois: “Ameboides” e “Bairro”. O primeiro, um grupo de amigos que se conheceu na escola, enquanto o segundo foi formado na pandemia, juntando amigos e amigos de amigos. Com o tempo, a interseção entre ambos os conjuntos, da qual eu fazia parte, levou a criação de uma linda e inquebrantável união que hoje dá nome ao Substack em que você se encontra e a infame conta do Twitter.
Ao longo da pandemia e os anos de readaptação da sociedade, o Amebairro se tornou a definição de “Brasil” para mim. Morando do outro lado do Atlântico, falando espanhol todos os dias, meu corpo clamava por voltar à casa para conversar com meus amigos, ou pela chegada da madrugada para perder o sentido do tempo jogando com eles. Mudar-se de país na adolescência traz o sentimento de ter sido arrancado de sua própria vida, e durante um tempo, é inevitável ansiar por voltar atrás. Estes amigos foram uma espécie de casa que existia virtualmente para mim. Nos momentos mais pesados desses anos, eu sabia que eles estavam lá para me ouvir e me apoiar, e sou extremamente grato por isso.
Também sou grato a Deus por estar vivendo na época da tecnologia que temos, que nos permite dar continuidade a amizades distantes, aprendendo a amar mesmo estando longe. Contudo, apesar do acesso às palavras e à voz de meus melhores amigos, suas almas encriptadas em letras e sons, a distância nunca se torna irredutível.
Nunca vou me esquecer de uma ilustração dada pelo meu primo, que também experimentou essa vida de mudanças repentinas. Imaginemos a passagem do tempo de, por exemplo, cinco anos para duas pessoas. Passar cinco anos longe de alguém é equivalente a andar uma “distância” de cinco anos para longe dela. Mas a grande questão está em que as outras pessoas em nossas vidas continuam vivendo e caminhando, sempre, em alguma direção. O resultado é que ambos andam em direções opostas, o que faz com que o que separa uma da outra não são cinco, mas dez anos de vida experimentada.
Sempre me imaginei “reduzindo” a superfície temporal pela qual eu e meus amigos nos afastávamos com as nossas conversas frequentes e constantes atualizações, pelos desenhos animados e álbuns escutados todos os dias. É uma luta pelo inevitável: nos tornamos pessoas diferentes, afastadas pelo espaço e pelo tempo. Mesmo que não andássemos um ano inteiro em direções opostas por causa da amizade viva que tínhamos, cada dia separado era um dia de diferença construído no caminho que nos separava.
Soa trágico, mas na verdade, não é algo ruim. Meu maior processo nesse sentido foi aprender a não correr atrás do passado. Aprender a não evitar o tempo. Eu não queria que nem eles, nem eu, virássemos pessoas tão diferentes. Mas será que nos encontrarmos não é o que realmente nos liberta?
Estamos todos na talvez laboriosa, mas alegre e libertadora, missão de tornar-nos quem realmente somos, e acredito que talvez a parte mais difícil desse processo seja abandonar aquilo que alguma vez foi, mas não é mais.
Pensar nisso me faz olhar para o conceito de ressurreição. No cristianismo é frequente o simbolismo do “velho homem”, a consumação do nosso passado, que precisa ser abandonado, morto, para deixar o novo entrar e viver. Apesar de sua aplicação dentro da fé, penso que qualquer um pode identificar um “velho si” que foi transformado. Estamos na constante renovação de nossas vidas, no fazer do futuro o presente e do presento o passado.
Ao mesmo tempo, ao ser levantado da morte, você continua sendo >você<. Mesmo ao deixar atrás o passado, ele vai sempre ser a matéria prima do que somos. Tornar-nos quem realmente somos não é negá-lo, mas construir algo novo com o que fomos, soltando alguns de seus elementos e abraçando outros. Sinto que nunca vou deixar de gostar de Avatar e de Origami Angel.
Sair do grupo alguns meses atrás não foi uma decisão tão fácil, mas fez muito sentido para mim. Dando voltas no que escrever, pensei que esta poderia ser uma carta de amor e agradecimento a vocês, Amebairro, que tanto me amaram e que eu tanto amo. “Amar é deixar ir” as vezes é verdade. Passar a página foi uma forma de amá-los pelo que são, sem querer impedir nossos próprios caminhos. Vocês são parte do que sou e do que serei. Vocês me ajudaram a estar mais perto de me tornar quem realmente sou.
Embora todos tenhamos essa “missão” pessoal de nos encontrarmos, podemos estar atrasando o processo ao andar em sentido contrário a ela. O essencial é encontrar a luz que nos leva para fora de nossas sepulturas, nos ressuscita em alguém renovado pela mudança, renovado pelo deixar coisas atrás, pela morte que traz vida. Vocês foram parte dessa luz naqueles dias.
Não sei se isso tudo soou como um coming of age meio brega, mas talvez eu seja um coming of age meio brega, sei lá. Talvez algum dia eu volte a escrever por aqui, quem sabe algo menos ou mais meloso. Acontecendo ou não, desde a minha maior sinceridade, só quero dizer que eu amo muito vocês e sinto muita saudade.
🫶🏻🫶🏻
segunda vez q um artista que amo sai de um grupo pra virar missionario forças Levi te amo muito!!!