Mateus 5:13
Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens.
Por Dhavi Aron
No primeiro texto publicado aqui neste Substack, minha queridíssima amiga
nos torna cúmplices de uma pequena mentirinha: fingir que ela esta apenas compartilhando o quanto ela é interessante. Confesso que nos meus planos meu primeiro texto aqui seria algo mais técnico, mais ponderado, algo sobre o qual eu tivesse firme convicção de estar certo. Contudo, após ler o belíssimo texto que citei acima, fui tomado de certa inveja e senti a necessidade de escrever algo que também viesse do coração.Tenho revisitado o pensamento de que eu não sou interessante, e não digo isso num tom de autocomiseração, até porque acredito que os amigos que tenho e o carinho que recebo existem justamente porque sou de alguma forma interessante, então, por favor, não me confunda com uma pessoa humilde. Acontece que, ao me observar, tudo em mim parece herdado do ambiente. Você pode achar isso bonito, e de fato é, eu mesmo posso citar alguns exemplos: minha mãe e meu gosto pelo cinema, meu pai e minha paz inabalável, meu amigo de infância Joabe e meu gosto pelo desafio, meu amigo de pandemia — e pra vida toda 😘 — Gab Bastos e minha necessidade de dar um abraço apertado sempre que encontro meus amigos.
Mas onde está a minha contribuição nisso tudo? É comum que ao se apresentar as pessoas digam sua profissão, sua área de estudo, seus interesses. E tenho me perguntado, será que é isso que sou? Sou um programador? Isso é o que faço, e sinceramente, só o faço porque recebo um bom dinheiro — ao menos comparado aos exemplos ao meu redor — caso contrário, definitivamente não programaria. Também sei que definitivamente não sou — nem serei — professor de História. Não à toa tranquei o curso. E quanto aos meus interesses? Não quero acreditar que o que pode me tornar interessante é meu fascínio por Doctor Who na infância ou minha paixão pelas peripécias do Nathan Fielder. Dizer “gosto de rock e ir ao cinema” não me torna diferente do jovem médio curitibano. Será mesmo que tudo que tenho pra me “tornar interessante” cabe em uma bio do Tinder?
Talvez minha dúvida, afinal, não seja se sou interessante, mas se há algo em mim que seja somente meu. Um jeito egoísta de ver parte da minha própria personalidade como algo que não foi herdado, copiado, aprendido ou sequer dividido com ninguém.
É inevitável pra mim não relacionar isso com a computação. Quando você insere uma senha em um sistema, ela nunca é armazenada como foi digitada, mas passa por um processo de criptografia que transforma aquela informação em algo irreversível. Mesmo que duas pessoas insiram a mesma senha, o resultado nunca será o mesmo, porque o sistema adiciona um dado único. Chamamos esse dado de salt. Talvez seja isso que eu esteja procurando de fato, esse sal que me tempera e me torna diferente. Um traço, um detalhe, um ruído. Talvez esse sal de que estou falando não exista em mim, talvez esse sal não tenha um nome, ou talvez ele simplesmente não seja acessível.
Só sei que, por enquanto, continuo procurando.